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O Sol na Cabeça - Histórias que iluminam, conectam e transformam

O Sol na Cabeça, livro de estreia de Geovani Martins, é um mergulho visceral na realidade das periferias cariocas, conduzido com uma autenticidade rara na literatura contemporânea brasileira. Por Thaiane Machado

O clube do livro do bunker















Composto por 13 contos, o livro apresenta histórias que oscilam entre a dureza e a beleza, expondo as contradições de crescer em um ambiente marcado por desigualdades, violência e resistência. Geovani Martins se destaca por sua capacidade de capturar o cotidiano com uma linguagem vibrante, repleta de gírias, oralidade e nuances que transportam o leitor para os becos, vielas e ônibus lotados do Rio de Janeiro. Essa escolha estilística é uma das maiores forças do livro, ela subverte a hierarquia literária, colocando o jeito de falar da periferia no centro de uma narrativa literária de alta qualidade.


Os temas abordados – juventude, exclusão, violência, pertencimento e resistência – são apresentados com crueza e sensibilidade. Martins não busca romantizar a vida na favela, mas também não a reduz à tragédia. Ele encontra, nas pequenas alegrias e nos laços comunitários, uma forma de celebrar a resiliência e a humanidade de seus personagens. Contos como "Rolézim" e "Estação Padre Miguel" revelam as tensões entre o morro e o asfalto, enquanto "O Rabisco" e "Roleta-Russa" exploram os dilemas da juventude periférica que tenta, à sua maneira, afirmar sua identidade em um mundo que muitas vezes a marginaliza.


No entanto, a maior conquista de O Sol na Cabeça é sua capacidade de criar empatia. Acabamos experienciando o que é crescer em um ambiente onde o futuro é incerto, onde a repressão policial é constante e onde a sobrevivência, em si, é um ato de coragem. Ao fazer isso, o autor desafia o leitor a olhar além dos estereótipos e enxergar a complexidade e a dignidade dessas vidas.


A estrutura narrativa de alguns contos pode soar abrupta e a insistência na oralidade, embora poderosa, pode dificultar o engajamento de leitores que não estão familiarizados com o universo retratado. Ainda assim, essas escolhas estilísticas reforçam o compromisso de Geovani em ser fiel às suas origens e ao ambiente que representa. O Sol na Cabeça é um livro que emerge dela, com todas as suas camadas e contradições. O livro prova que a literatura brasileira tem espaço para múltiplas vozes e histórias, especialmente aquelas que por tanto tempo foram silenciadas.

Quando nós tava quase passando pela fila que eles armaram com os menó de cara pro muro, o filho da puta manda nós encostar também. Aí veio com um papo de que quem tivesse sem dinheiro de passagem ia pra delegacia, quem tivesse com muito mais que o da passagem ia pra delegacia, quem tivesse sem identidade ia pra delegacia. Porra, meu sangue ferveu na hora, sem neurose. Pensei, tô fodido; até explicar pra coroa que focinho de porco não é tomada, ela já me engoliu na porrada.- Geovani Martins

Poucos livros têm o poder de nos tirar da zona de conforto e nos transportar para um mundo tão intenso e visceral como O Sol na Cabeça, de Geovani Martins. Durante o encontro do clube do livro, com o tema "Experienciar", foi impossível não perceber como as histórias do autor tocaram as mulheres presentes - tanto no encontro presencial, quanto no online -, criando uma conexão emocional e provocando reflexões que ecoaram além das páginas.


O tema "Experienciar" ganhou um significado ainda mais profundo nesse contexto. Porque O Sol na Cabeça não é uma obra para ser sentida, vivida e refletida. Foi um convite para enxergar a realidade de jovens que crescem entre o morro e o asfalto, mas também nos desafia a olhar para nossas próprias experiências e encontrar nelas força, resiliência e beleza.


Ao final do encontro, vimos a importância de compartilhar histórias — tanto as da literatura quanto as nossas. Assim como os contos do livro, as histórias das mulheres no grupo são marcadas por desafios, mas também por resistência e esperança. O que aprendemos, juntas, foi que "experienciar" não é apenas passar pela vida, mas permitir-se sentir, refletir e transformar-se a partir dessas vivências.



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